A última visita Real - História de Almeirim (30)


Os primeiros anos do século XX, anunciavam prosperidade para Almeirim.
As ligações comerciais com o vinho do Porto, criavam uma oportunidade enorme, pois ele seria enriquecido com a aguardente da destilação do vinho da casta Fernão Pires.
Muitas caldeiras de destilação de aguardente vínica foram então construídas na Vila de Almeirim. Todos os grandes vinicultores tinham a sua caldeira e também muitos negociantes construíram a sua própria destilaria.
Este grande número de caldeiras, todas em funcionamento simultâneo, originavam uma enorme azafama de transito e um cheiro muito característico, que misturado com aquele também intenso cheiro do mosto das adegas, produzia o que chamamos o “ Cheiro de Almeirim”.
O Cheiro de Almeirim é nostálgico, para todos os que tiveram o privilégio de o sentir e felizmente eu sou um desses privilegiados.
Das adegas até às caldeiras circulavam uns estranhos carros puxados por cavalo ou por mulas, carregando o casco cheio de vinho ou de água pé.
Era uma azáfama danada, de um lado para o outro de cavalos batendo com os cascos nas ruas de seixo, cujo som já não mais se poderá ouvir.
Esses carros de transportes, também eram uma exclusividade da Vila de Almeirim, os Aranhóis.
Que muito correctamente foram honrados, como símbolo, ao ser um desses exemplares colocado numa rotunda da cidade.
Mas no final da primeira década, novos dramas aconteceram na Vila.
A 29 de Abril de 1909, um forte terramoto com epicentro na zona de Benavente, provocou de novo estragos consideráveis na Vila.
Todo o baixo Ribatejo, em especial as povoações da margem esquerda foram seriamente atingidas, houve muitas vítimas mortais, muita gente ficou sem abrigo e com todos os seus haveres perdidos.
No Natal desse mesmo ano, chuvas torrenciais provocaram a maior cheia de que há memória. De novo a destruição e novas vítimas.
Portugal vivia então uma época muito conturbada social e politicamente. O Rei D, Carlos e seu filho tinham sido assassinados vilmente em plena via pública, na praça do terreiro do Paço, em Lisboa.
Havia um novo Rei, um jovem de dezanove anos, D. Manuel II, que tentava evitar toda uma vasta onda de acções revolucionárias promovidas pelos grupos que pretendiam a instalação do regime republicano.
Este jovem Rei, era incansável na sua acção de atenções para com o seu povo.
Ele esteve em Benavente, a liderar todas as manobras de salvação e apoio quando do terramoto de Abril.
Ele veio a Almeirim para apoiar as vítimas da cheia do final do ano de 1909.
Foi aqui recebido pelo então Presidente da Câmara, o ilustre Dr. Guilherme Godinho, que apesar de ser um distinto republicano, tendo sido o primeiro deputado nacional de Almeirim após a implantação da República, não deixou de cumprir com elegância e simpatia a sua função e recebeu o Rei, com toda a dignidade e agradeceu toda a atenção e preocupação que a sua estadia representava.
Foi a última visita real a Almeirim.

1 comentário:

  1. Que saudades desse tempo. Apesar de só ter 40 anos, ainda vi aranhóis e ainda senti esse cheiro que alagava as ruas da Tróia.
    Parabéns por este excelente espaço.

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